sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
INQUIETUDE por Perpétua Amorim
Inquietude
Quando aninha cá dentro
Uma saudade de não sei o que
Uma inquietude danada
Dessas de doer as entranhas
Misturando os sentimentos
Buscando uma estranha razão.
Mas quem disse que eu procuro razão?
Quero mesmo é divagar
Entre sonhos e pesadelos
Entre o real e o abstrato
Correr como corre o rio
Com sua língua desvairada
Lambendo pedras e ribanceiras
E sem culpa cuspir no mar.
Mas quem disse que eu procuro o mar?
Quero mesmo é olhar as estrelas
Pegar uma a uma na palma da mão
Fazer delas um banquete especial
Para o meu pobre andarilho
Que busca mais... Muito mais
Do que água e pão.
Mas quem disse que eu quero pão?
Quero mesmo é cavalgar por montanhas infindas
Atrás do meu ouro em potes
Que herdei de Ali Babá
Libertar-me da antiga túnica
E vestir meus sete véus
Engasgar-me com o que restou do vinho
E ser expulsa dos céus.
Mas quem disse que eu não quero os céus?
GRÃO DE AREIA por Altair Cirilo
Sabedoria é a coisa principal. Adquire sabedoria; e com tudo que adquirires, adquire compreensão.
Provérbios 4:7
Eles têm delírios,
segredos, prioridades,
têm planilhas,
a trama em Wall Street
(mas um ínfimo grão de areia
eles não podem conceber)
Eles têm objetivos,
diretrizes, portarias,
têm o sistema binário,
e tentam encontrar Pasárgada
dentro das enciclopédias
(mas um ínfimo grão de areia
eles não podem conceber)
Eles têm glamour,
conceitos,
desejo, erro,
têm síndrome do pânico
(mas um ínfimo grão de areia
eles não podem conceber)
Eles têm cartão de crédito,
estatística, soberba,
cronogramas,
têm a ponte de Brooklin,
o canal do Panamá
(mas um ínfimo grão de areia
eles não podem conceber)
Eles têm slogans como:
quem pode mais chora menos
e
o mundo é dos espertos
(mas um ínfimo grão de areia
eles não podem conceber)
Eles têm poliuretano,
betume, asbesto, alcatrão,
(mas um ínfimo grão de areia
eles não podem conceber)
Eles têm codeína,
dexametasona,
sulfametoxazol,
têm mecatrônica,
astrologia, web,
têm mais que sete pecados,
mais que trinta dinheiros,
bem mais que quarenta ladrões,
têm a meta, o modo, a função,
tem o destino,
o emblema,
o paideuma
(mas um ínfimo grão de areia
eles não podem conceber)
Eles crêem em utilidade,
no valor comercial de cada ato,
na devida posição conforme a posse
Crêem em música para relaxar,
história para dormir,
arte como vitrine,
poemas (diferentes deste)
que celebrem tudo que têm
(então qual o sentido de coisas simples
como um ínfimo grão de areia?)
eles avançam, crescem, evoluem,
obstinados, cegos,
crentes em sua fé
num deus ex machina
(não, não podem conceber
um ínfimo grão de areia)
quinta-feira, 28 de janeiro de 2010
MÁGICA por Carlos Bruni
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
SETEMBRO NEGRO por Edweine Loureiro
domingo, 24 de janeiro de 2010
AMÉLIA por Rosana Banharoli
Redemoinho de histórias e refeições
Rasga o espaço e suga-me para seus mistérios
Hálitos e hábitos que nunca romperam a mordaça.
Enevoado, espectral.
Sustentada por vertentes de notas
Flutuo nos cheiros fugidios de velhos baús.
Hortelã capim-cidreira erva-doce melissa.
Braços estendidos a tocar o passado buscam
A clareza das respostas empoeiradas nos bolsos
De antigos casacos.
Queijo branco doce de abóbora compota de figo
Bolinho de chuva leite com groselha.
Mãos senis do outro lado,
Onde quase chego.
Piso na relva que alicerça esta passagem .
Sinto as pequenas flores que descolaram de seus vestidos.
Quero me confortar nelas.
Só alcanço o raminho de arruda de traz de sua orelha.
Chorinhos e risinhos de pés descalços guardados em seus ouvidos
De cabelos lilás e avental de plástico.
Desço os degraus esverdeados de meus devaneios e,
A música chega ao final.
RETRATO TRAÇADO por Junior Filth
Num molde abstrato
Faço, refaço
- traço a traço -
Os riscos do retrato
Imagem de adjetivos
Crassos, escassos
Que do fracasso repasso
Servindo as palavras como aperitivos
Para o leitor, ofereço a talher
E passo a passo
Em pedaços me estilhaço
Ao mostrar o esboço da perdida mulher
Horas após, na janela discreta
Apoio os braços no aço
Dos abraços devassos
E sob a luz das estrelas, me torno poeta.
ESTAÇÕES E LEMBRANÇAS por Junior Filth
Sentia aquele corpo feito brasas me corrompendo;
A beleza fulgurava ardente em meio à ilusão.
Perdido em lembranças, vejo-a insaciável e cedendo,
Aplacada por minhas carícias numa noite de verão.
Por ela, desvelei o eterno fascínio
Quando pôs fim a dor e ao meu abandono.
Felizes, não pensávamos no possível declínio
Dos dias lascivos que nos amamos ao outono.
Subitamente, veio a última vez
Das palavras doces de amor eterno.
Relutei ao vê-la tomada pela lividez
No ataúde exposto à frieza do inverno.
Restam agora apenas lembranças
Da mulher que não mais me espera.
Guardarei para sempre nas entranhas...
A solidão da inalcançável primavera.
sexta-feira, 22 de janeiro de 2010
quinta-feira, 21 de janeiro de 2010
POEMA DOS DEZ DEDOS - por Elias Araújo
Sobre gestos poliglotas,
de linguagem universal.
Sobre antigas portas
que se abrem
para o bem
ou para o mal.
Sobre meninos
pequeninos
arteiros.
Sobre carinhos
primeiros.
Sobre verbos
eternos
que acionam sem quaisquer medos
gestos não verbais
não orais
apenas mais
dos dez dedos:
Tocar
a pele
de leve
devagar!
Penetrar
pelos cabelos
retê-los
como ondas do mar!
Agredir
o alheio
sem receio
desenhar-se na face:
desenlace!
Segurar
a mão
o perdão
do outro magoado
ser humano amado.
Enxugar
a lágrima
a lástima
como se seguram estrelas.
Acariciar
as mãos
com as mãos
na mágica de prendê-las...
quarta-feira, 20 de janeiro de 2010
QUARTO COM SUÍTE - por Éder Rodrigues
Salvo tuas mãos do sono, onde agora tudo singra e nada breve é o que se espera. Nenhuma palavra rompe o eterno que se desenha ou o impossível que se desculpa. Rente no assim tão dentro do enlouquecer dos dedos, do caminho que não conseguem. Teu escrito molhado num vício-corpo é qualquer coisa entre ir, sem se levar. Tudo escorre. Tudo migra. A distância não vira poema. Só o olhar de quem morre, de quem pede fim. Solidão coberta por lençóis de linho. Espelho-teto de uma lua amíngua.
.
Salvo tua boca do silêncio onde agora nada vinga. Socorro tua palavra do corte, da nossa imagem embaçada nesse pedaço de céu espelhado. Gozo incerto que adormece os homens, antes de serem homens. Corpos num eclipse afora, na fase diminuta de seguir, ficando. Teu rastro de quem esquece, tua loucura de quem já se foi. Sono de quem arde ou adormece assim. No instante rompido de não estar, estando. Solidão nua. Sem lençol sem nada. Num banho morno de sarar não-ditos, de curar os escritos pontiagudos da tua língua.
Salvo tua boca do silêncio onde agora nada vinga. Socorro tua palavra do corte, da nossa imagem embaçada nesse pedaço de céu espelhado. Gozo incerto que adormece os homens, antes de serem homens. Corpos num eclipse afora, na fase diminuta de seguir, ficando. Teu rastro de quem esquece, tua loucura de quem já se foi. Sono de quem arde ou adormece assim. No instante rompido de não estar, estando. Solidão nua. Sem lençol sem nada. Num banho morno de sarar não-ditos, de curar os escritos pontiagudos da tua língua.
VISITA - Por Tatiana Alves
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